6 de dezembro de 2008

Um Deus conveniente

Que Deus anunciamos? O Deus que nos vem ou o Deus que nos convém?

Muitos pregadores e fiéis trocaram o Deus que lhe vem pelo deus que lhes convém. Pode acontecer se é que já não aconteceu conosco! Que Deus anunciamos? Aquele que é quem é, ou aquele que é como nós imaginamos que seja, ou que gostaríamos que fosse?È cada dia mais perceptível no discurso dos templos e da mídia o anuncio de um Deus pessoal, visto apenas a partir do próprio ângulo. É como descrever uma cachoeira apenas pelo que vemos e não pelo que ela é e a partir das descrições de outros que a viram de outros ângulos. Não somamos a vista dos outros. Ficamos apenas com a nossa que achamos ser ou a única ou a mais verdadeira e condizente.Percebe-se em muitas pregações um discurso não a serviço do Deus que vem, mas do Deus que mais convém. Os pregadores nem sequer disfarçam duas intenções. O discurso é pragmático e utilitarista. Não anunciam o Deus que é quem é, mas o Deus que fez isto mais aquilo por eles e por meio deles. O verbo ser cedeu lugar ao verbo fazer. Deus faz acontecer e nós fazemos acontecer em nome de Deus, logo somos mais de Deus do que os outros.O que seria crer no Deus que vem? Seria aceitar Deus como Ele quer vir, como for da vontade dele, no tempo dele e o jeito dele. Pode até ser bonito querer apressar o tempo de Deus, mas nem sempre é gentil e respeitoso. Muitas vezes é inútil. No dizer de Jacques Attali “o tempo é a única realidade verdadeiramente rara, pois ninguém pode produzi-lo, ninguém pode vender aquele de que dispõe, ninguém pode acumulá-lo.” (Uma breve Historia do Futuro, 2008, pg 127, Novo Século)Crer no Deus que vem seria muito mais crer do que arrotar certezas de milagres, muito mais pedir do que garantir que Deus agirá deste ou daquele jeito. Uma coisa é apostar que Deus agirá de um jeito ou de outro e bem diferente apostar que agirá deste ou daquele jeito. Não se diz a Deus o que Ele fará, nem quando, nem a quem. Crer no Deus que vem seria viver o “Pai Nosso”, prece na qual, além de louvar o nome do Senhor, o fiel aceita a vontade dele do jeito dele no céu e na terra.

É também pedir o pão necessário de cada dia, e não necessariamente riquezas e primeiros lugares e conta mais polpuda no banco. Seria ainda pedir perdão e perdoar. Seria admitir que sabemos pouco e querer saber mais sobre Deus. E o que seria anunciar o Deus que nos convém? Seria inventar com Ele uma cumplicidade que não existe usar seu nome em vão, trombetear nossa caridade e nossa capacidade de converter, curar e expulsar demônio. É pregar coisas como “traga o seu demônio que os o expulsamos” E se não houver expulsão será por culpa da sua falta de fé... É garantir ressurreições, três delas na mesma tarde e, além disso, alardear o milagre pelo rádio.

Anunciar o Deus que nos convém é criar demônios da dengue, da malária, da diarréia, da unha encravada, da dor de cabeça, para mais facilmente o derrotar no templo e, assim, fazer o fiel pensar que foi a prece e a exortação do pregador que mandou os demônios de volta ao inferno. É chamar a atenção não para o poder de Deus, mas para o poder dado ao pregador. É derrubar pessoas com toque poderoso e chamar a mesma pessoa para dar testemunho de cura para atrair mais gente. É falar com o demônio ao microfone e solenemente expulsá-lo na frente da assembléia e dos telespectadores. É cobrar o dizimo e garantir que quem o paga vai para o céu e quem não o paga não cresce na vida. Crer no Deus que nos convém é dar o microfone a quem se declara curado e negá-lo a quem, dois meses depois, volta para avisar que a doença voltou! É prometer grandes prodígios na Rua X, numero 25, Bairro Y, às 3,15 da tarde. É adotar o discurso não compromissado de quem não pode criticar o governo que lhe concedeu aquele canal.

Crer no Deus que nos convém seria anunciar revelações que não existiram, visões que não aconteceram, dar uma de profeta que não somos garantir que o anticristo já veio e está agindo nos outros, principalmente nos adversários... Seria super-exaltar os nossos santos e negar os dos outros. Seria sugerir ao povo que ande sem medo pela rua, porque os anjos de Deus cuidarão de cada fiel, mas ele mesmo, o pregador dispensar os anjos e andar com três ou quatro guarda-costas...

Crer no Deus que nos convém seria vender óleo de cozinha como se fosse óleo santo das oliveiras de Jerusalém, medalhas com água do Rio Jordão, pó da Terra Santa. Seria vender uma água na qual Jesus não tocou. Quando o pregador não explica e não põe os pingos nos is, o fiel acaba atribuindo pontos ao tamanho da vela.Com facilidade se prega hoje na mídia um Deus conveniente que ajuda a angariar adeptos, porque o dízimo dado a Deus reverte em barcos, casas, empregos e sucesso financeiro. Será assim tão fácil? A Bíblia não diz que é sempre assim. Anuncia-se um Deus do tipo “dê que eu dou”, “ não dê para ver o que lhe acontece”... O mundo está cheio de porta-vozes com recados que Jesus não mandou dar, mas assim mesmo são dados porque é melhor um templo cheio de gente que não questiona ou exige provas do que um templo com cem pessoas cheias de perguntas e questionamentos. Gente dócil enche mais templos do que gente indócil, que não se deixa doutrinar aos gritos. Gente dócil prefere uma fé que não exija provas ao pregador. É altamente suspeito um templo onde o demônio fala ao microfone e é expulso, mas nenhum anjo ou santo pode falar. Como é que é? Entrevista-se o fiel possuído pelo demônio e não se entrevista o fiel possuído por um anjo? O demônio fala e os anjos e santos não falam? O inferno fala e o céu fica mudo?Sim, o céu fala coisas novas. Mas que coisas? As que a Deus convêm ou as que convêm às novas igrejas, ao movimento e ao pregador que precisa segurar aquele povo à sua frente?E então? A mídia muda ou não muda o discurso das igrejas? Se estiver lendo estas páginas em aula, debata e discuta! Quem muda quem na mídia?

Pe Zezinho, scj

5 de dezembro de 2008

A sopa, a concha e o caldo

A história é curta, mas provoca. E como algumas das histórias de Jesus têm o intuito de provocar. Lembra-se das parábolas do fariseu e do publicano e do bom samaritano? Eram provocações. Jesus se referia a um tipo de religioso que precisava repensar as suas atitudes.
Numa comunidade que recebia os pobres às 18 h, para o sopão do dia, havia seis voluntárias que serviam os mais de 80 pobres que vinham ali buscar a sua sobrevivência. As latas dos pobres eram grandes. Nelas cabiam quatro a seis conchas. Levavam para suas casas. O panelão tinha quase 60 centímetros de altura. Era sopa de conteúdo, com grandes nacos de carne, costelas, batatas, repolho, deliciosa e substanciosa.

Cinco das voluntárias mergulhavam as conchas no panelão e serviam aos pobres a sopa grossa, plena de conteúdo. Uma delas, porém, não se sabe por que razão recusava-se a servir pedaços grandes aos pobres.

Era toda light e acreditava em dieta light. Para ela uma sopa valia pelo caldo. Afastava nacos e os pedaços e servia a sopa rala. Não havia como convencê-la. Se alguém da equipe se distraía, lá estava ele servindo aos pobres apenas o caldinho. Foram tantas as reclamações que a equipe a tirou daquela função.

Na pregação há padres e leigos que cometem o mesmo erro. Poderiam dar um conteúdo mais profundo, porque livros e documentos os há em abundância nas livrarias, estantes e bibliotecas. Mas não há como convencê-los. Não lêem, não anotam, não preparam. E lá estão eles, repetindo sempre os mesmos chavões, dando a mensagem suave e gostosa de ouvir, com as mesmas palavras de todo o sempre, porque se recusam a dar o conteúdo sólido da fé. Só falam ao espírito e do espírito. Estão ali para salvar almas. A política é para outros o para depois. Eles apenas, apenas, apenas, apenas e outra vez apenas anunciam a conversão pessoal e o encontro pessoal com Cristo.

Não peça para pregarem doutrina social porque não farão isso. Sentem-se deslocados tendo que comentar uma Gaudium et Spes, uma Mater et Magistra, uma Populorum Progressio ou uma Solicitudo Rei Socialis. Aquilo é coisa do passado. A onda agora é o espiritual porque dizem que o social não levou a nada. Não mesmo! Aqueles mártires e o silencio doloroso de centenas de bispos terão sido sacrifício inútil, ou veremos suas luzes daqui a alguns anos, quando o discurso das igrejas de resultado, do sucesso e da mais valia mostrar sua falácia? Não vai mostrar? Mateus 7.15-28 e 25,31-46 valem ou não valem?

Como estudar parece que lhes faz mal, acham que o povo não precisa do que eles não querem. Parecem o garçom que se recusa a servir uma comida com a qual não se dá bem. Vale apenas o que ele come e não o que o povo precisa e quer comer!...

Pe Zezinho, scj

3 de dezembro de 2008

Sólida Doutrina

Palestra do P. Zezinho scj à RCC Nacional (Guaratinguetá 2008)

ABERTURA
Em nome do Pai. Do Filho e do Espírito Santo. Com a licença de vocês - que agora pouco eu vi ser convidados, a espalhar a cultura de pentecostes; carismáticos que vocês são... Com a licença de vocês, eu também carismático que sou... Vocês da RCC e eu da Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus, comecemos a refletir. Vocês divulgam a cultura de Pentecostes e eu a cultura da Compaixão e do Coração – o que vem a ser a mesma coisa.
Com a licença de vocês, venho falar hoje de quatro temas:
1-católicos situados,
2-católicos sitiados,
3-católicos perplexos,
4-católicos resolvidos.

Eu me inspiro para falar sobre isso num livro do padre Agenor Brighenti, grande antropólogo e sociólogo da Igreja de agora, catarinense, que escreveu a Igreja Perplexa. Também me inspiro em alguns livros que abordam esse tema. Um deles está traduzido em português: “O Sal da Terra”, que é uma entrevista que um jornalista agnóstico fez ao cardeal Joseph Ratzinger, hoje Bento XVI. O Papa, conversando com o jornalista que demonstra grande conhecimento da doutrina católica, situou a Igreja no mundo de hoje. A entrevista foi continuada num outro livro. Ainda não existe tradução no Brasil. Acabo de falar com um dos editores sobre o livro “Dio e l`Uomo”. Nele, a conversa do papa com o agnóstico continuou e o excelente catequista que é o papa responde diretamente ao amigo de outra convicção sobre como ser Igreja num mundo perplexo; uma Igreja que também se reconhece perplexa em alguns assuntos, mas, resolvida em muitos outros. A humildade do Papa o fez reconhecer que em alguns aspectos nós católicos somos perplexos. Não temos todas as respostas. Mas, em alguns aspectos fundamentais nós somos resolvidos. Sabemos o que queremos. Também me apoiei no Lexicon, que é um livro novo – e aconselho a todos que o procurem – do Pontifício Conselho para família; termos ambíguos discutidos sobre família, vida, questões éticas. Editado pela CNBB. Acho que todo casal, sobretudo se é líder, como vocês são e querem ser, deve lê-lo.

Eu quero ser fazedor da História; vocês também. Mas, não é possível ser fazedor da História se a gente não o faz com a Igreja. Pelo menos um católico não pode fazê-lo sozinho. E também não o faz sem a família, porque sem família não há história. Queremos criar famílias menos perplexas e mais resolvidas. Mas, para isso, precisamos conhecer os temas básicos da Igreja; sobre a espiritualidade do homem e da mulher, da família enfim; sobre os dramas e sofrimento das famílias e as respostas que a Igreja lhes oferece. Este Lexicon já está em português. Pouca gente conhece, mas, é um tesouro. Pedi que também traduzissem o Enchiridyon della Família. Que é da editora da minha congregação, mas é dirigido pelo Conselho Pontifício da Família. Quem quiser saber tudo o que a Igreja falou nesse último século sobre a família conheça este livro. Acredito que vai ser traduzido. Foi nesses livros que acabo de indicar que fui buscar, juntamente com algumas reflexões do Papa – que eu já disse que é um excelente catequista; um homem situado que não se deixa sitiar – foi neles que eu fui buscar as idéias de hoje.

SITUANDO-NOS

O que está acontecendo? Nós somos humanos, ninguém de nós pode dizer que tem espiritualidade suficiente para sozinho, ou em pequeno grupo dar respostas para um mundo tão desafiador e tão agressivo – como são o mundo, a mídia, e em geral as comunicações de hoje. Sozinho você não vai saber responder. Só um grupo também não saberá. Cada movimento da Igreja, seja ele Movimento Familiar Cristão, Encontro de casais, e mais de 50 movimentos dedicados à família na América Latina, seja ele RCC, ninguém sozinho tem espiritualidade suficiente ou cultura suficiente para ajudar a resolver esse magno problema, mas, todo juntos têm. Sozinhos, repetirão e levarão ao mundo os conceitos básicos da nossa Igreja sobre o homem e a mulher, mas sem profundidade. Sem antropologia não dá. Nós temos que saber quem é o homem, do ponto de vista de si mesmo, no Brasil de hoje e na sua região; e precisamos saber também quais as conseqüências da comunicação que chega a essa criança e a esse adolescente, a esta mulher e a este homem; a esta família, enfim. Quando começamos a entender o sociológico da fé que está nos documentos da Igreja, que além do catecismo publicou também um Compêndio da Doutrina Social entendemos também não só o sociológico, mas também o psicológico e o pedagógico da família. Quando nós começamos a entender tudo isso, entendemos melhor o homem que se casou e o que não se casou. Também o que terminou um casamento. Vamos entender melhor a mulher que se casou ou não casou, ou terminou um casamento, foi abandonada ou abandonou. Sem antropologia, sem psicologia, sem sociologia nós não vamos entender nada disso. Aí você me diz: -Ô, padre, você quer que a gente saiba tudo isso? Não! Ninguém pode saber tudo isso. Eu quero que vocês prestem atenção nos irmãos inspirados por Deus, que se tornaram antropólogos para servir a Igreja, sociólogos para analisar a sociedade do ponto de vista da Igreja. Você não vai ter que ler os quinhentos livros que ele leu para ser tornar sociólogo. Mas pode muito bem ler os livros que ele escreveu, facilitando para você uma visão da sociedade. Não tem que ler todos os livros que o psicólogo lê, mas, você pode ler de alguns deles com visão cristã, e saber o que incide numa cabeça masculina ou numa cabeça feminina em tempos de liberdade excessiva. Você vai entender o eclesiólogo e, com ele, como anunciar Jesus em tempos de crise. E vai começar a compreender a contribuição desses irmãos, -queridos irmãos teólogos-, mais profundos do que nós; queridos filósofos, queridos historiadores católicos, queridos e sofridos estudiosos. Você vai perceber que nos trinta ou quarenta anos de estudo deles, eles e elas, porque há muitas mulheres doutoras, colocaram à disposição da Igreja um tesouro. Junto aos documentos da Igreja, dos bispos reunidos, do santo padre seus escritos nos fornecem sabedoria. Nem são precisos muitos livros: uns 40 ou 50 que a gente lesse no decurso de uns dez anos e teríamos uma idéia básica do que é ser católico hoje e situar-se como católico. Por que é que muitas famílias católicas não se situam e se sentem sitiadas por irmãos de outras igrejas, que vem puxar adeptos ou nos dizer na cara que estamos errados? Por que se sentem sitiadas pela avalanche de pornografia, pela avalanche de liberdade excessiva que lhes roubam os filhos? Estão sitiadas porque não souberam situar-se.

LIVROS E LEITURAS

Ano passado, em novembro, eu estive na Espanha pra fazer um encontro de comunicadores da minha Congregação, os Dehonianos, Padres do Sagrado Coração de Jesus. Depois fui à Itália. Fotografei uma cidade-fortaleza entre Nápoles e Ândria. É uma cidade fortaleza inexpugnável. Não havia como invadi-la porque estava num lugar de onde se via tudo. De lá, eles mandavam sinais para as cidades aliadas, caso fossem sitiados. Não eram sitiados porque estavam muito bem situados. Descobriram onde estavam e um lugar de onde podiam ter visão panorâmica do mundo ao seu redor. Então, ninguém conseguia conquistá-los porque eles tinham aliados, além disso, estavam em lugar onde ninguém tinha como sitiá-los. Tirei a foto da cidade e lá comecei a escrever o meu livro, que já está publicado. Mudei o título para: Da família sitiada à família situada. Mas, pode-se dizer a mesma coisa: Da família perplexa para a família resolvida. Hoje há uma Igreja perplexa – e há!, Não vamos tapar o Sol com a peneira–. Temos milhões de católicos inseguros na fé. Repetem frases dos outros, porque eles não têm o que dizer. Falta-lhes suficiente doutrina para pregar com segurança. Preferem ser repetidores de frases feitas. Mas porque não têm doutrina? Porque, - sinto ter de dizê-lo-: até padres, quantos mais leigos, não gostam de livros nem estudam sua fé! Conheço e não sei se vocês também conhecem, leigos que pregam uma, duas horas por dia no rádio, mas, nunca leram o catecismo da Igreja Católica. Estarei provocando vocês com uma afirmação mentirosa e exagerada? Ou falei a verdade? Conheço leigos e padres que falam da Bíblia, mas não a leram ainda nem uma vez por inteiro. Conheço pregadores da fé – e por vinte e cinco anos fui professor de Prática e Crítica de Comunicação na Igreja e até hoje gravo tudo o que acontece de pregação em televisão e rádio, das mais diversas igrejas-. Sei do que estou falando. Tenho lá gravados os discursos de pregadores que não leram e não lêem. Meu estudo é a linguagem da fé. Sinto ter que dizer que muitos pregadores traem o fato de que não estão situados. Não gostam de livros. Não lêem. Começam a falar e, depois de cinco minutos, você percebe que ele não lê nem livros nem documentos. Vai repetir pela centésima vez no ano a mesma coisa. É devoto da Santa Mesmice! Fala sem conhecer o último documento do Papa sobre a eucaristia. Não leu e é padre. Quando você ouve uma das suas frases, você diz: -Não tem contexto, está mal situada! Não está nos evangelhos, não está nos documentos da Igreja. Ele não se situou, ele não tem catequese! Mas, está pregando para milhares de ouvidos católicos. Como podem deixar que ele fale para milhões de ouvidos católicos? Deixaríamos um porteiro de hospital operar o coração de algum paciente? Mas é isso o que está acontecendo na nossa igreja em nas igrejas evangélicas! Há estranhos naqueles púlpitos! É como admitir um estranho que nunca estudou medicina numa faculdade a dar aulas de anatomia!


O BÁSICO DA FÉ

O mínimo que se pode exigir de um sacerdote ou de um leigo que prega é que conheça o catecismo da Igreja Católica. O mínimo que se pode exigir de alguém que anuncia Jesus é que ele tenha lido a Bíblia por inteiro, para ter dela uma visão abrangente, acentuando os evangelhos e as epístolas, seguidos dos comentários adequados, situados no devido tempo e aplicados para os dias de hoje. O mínimo que se pode exigir de alguém que deseja ser porta-voz da santa mãe Igreja Católica é que tenha lido algum livro de história da Igreja, para saber das virtudes, dos seus santos e dos seus mártires, desde os primórdios; para saber dos pecados, das imperfeições, das perplexidades da Igreja através dos séculos. Isto, porque ela é santa em projeto, mas na realidade, é peregrina e pecadora porque feita de gente como nós. E nós pecamos! O projeto é bom, mas a execução falha porque passa por nós.
Precisamos ler o básico da História da Igreja, para sabermos quando começou esta ou aquela heresia: os donatistas, os montanistas, os arianos, os nestorianos.. Quem começou, porque e em que circunstância histórica?...Quem foi o simpático sacerdote negro, cantor e escritor de livros e canções Ário que fez tantos discípulos no seu tempo e depois por séculos influenciou a Igreja. O que ele pregava? O que ele dizia sobre a divindade de Jesus? Por que a Igreja o julgou herético? Conhecendo a História da Igreja você vai dizer: ele fugiu da unidade nesse aspecto da sua pregação... Achou que a idéia dele teria que vencer na Igreja. Esqueceu-se de acender sua luz na vela dos outros, porque a mesma luz do Espírito Santo, difusa sobre o mundo, atinge todos. Que doutrina triunfou? Porque não aceitamos a catequese de Ário? Um catequista que fala no rádio e na televisão hoje precisa saber isso, posto que há livros e programas na mídia repetindo todos os dias o que Ário ensinava. A propósito, você sabe o que ele ensinava sobre a divindade de Jesus? Viu porque insisto no estudo da fé? Você talvez saiba, mas muitos católicos não sabem, embora se ouça repetir a doutrina de Ário em muitos programas religiosos que chegam aos nossos lares. O problema da fé não é a luz: são as cortinas e portas; algumas são abertas, escancaradas outras são frestinhas porque há crentes que morrem de medo da fé do outro. Olhamos de soslaio para os outros cristãos, seguros de que nós é que fomos chamados a tornar a Igreja mais pura. Mas nem sempre sabemos o que eles pregam, porque muitos de nós não sabemos nem mesmo o que pregamos. Consubstancial? Semelhante? Igual? Homo-ousios ou homo-i- ousios? E aí? Um sacerdote pode ensinar que Maria e Jesus tinham o mesmo DNA e por isso se pode “comungar Maria” porque ela faz com Jesus uma união hipostática? Não é heresia? Quando fechamos as portas a um irmão, só porque ele discorda de nós, mesmo que os bispos e o papa o vejam com bons olhos, algo está errado não nele, mas em nós. Somos mais cristãos quando aceitamos aprender com a sabedoria do outro irmão que não é do nosso movimento, mas, com quem se percebe que Deus está e quando dizemos: -Este movimento, essa experiência de fé é bonita. Quero conhecê-la. Não faço parte, mas é maravilhosa. Tem dado santos para Igreja! Nesta hora se vê quem é igreja e quem é sectário. Quem separa e isola não age como cristão. Quem aproxima, age. Quer ver que alguém é cristão? Veja que se ele elogia o que há de bom nos outros e honestamente tenta corrigir o que acha falho em si e nos irmãos de fé. Veja se ele aceita ser corrigido ou ignora seu conselho porque você não é do grupo dele, logo: não tem luz suficiente para ensinar àquele grupo! Ora, se uma comunidade deu santos para a Igreja, então ela merece respeito, ainda que dela discordemos neste ou naquele item. Se uma comunidade trouxe confusão à diocese, então ela precisa rever os perplexos que a infiltraram e que, como baratas tontas não sabiam pra onde ir e acabaram lá, prejudicando os bons e serenos daquele movimento. Falsos franciscanos, falsos dominicanos, falsos libertadores, falsos, reparadores ou falsos carismáticos a prejudicar os que vivem a unidade na Igreja...


CRER É QUERER MAIS

Você é um católico muito mais seguro se estuda e quer saber o que o Papa e os bispos estão dizendo; o que dizem os teólogos e especialistas. O carisma deles é esse: foram chamados a ser mestres, doutos e doutores. Trabalharam duro, estudaram vinte e trinta anos e nos brindaram com obras especialíssimas e maravilhosas. Semana passada comprei quatro livros de antropologia: Um de Carl Sagan, agnóstico, e outro de um ateu, respeitador das igrejas. O livro chama-se Quebrando o Encanto, o autor é Daniel Dennet. Ele mostra um imenso respeito pelos religiosos sérios. Critica os ateus superficiais e também os crentes sem conteúdo. Mas, tem respeito por homens de fé que fundamentam o que dizem. É um ateu que tem o que nos dizer. Os outros são de antropólogos religiosos que mostram o homem como um ser religioso. A religião tomou conta do mundo inteiro. Agora é preciso ver o que esta religião faz de bom e de ruim. O que vou fazer para o meu povo ser dono da sua história? Se eu não sei o que é um ser humano, se não tenho um conceito claro, como vou entrar em diálogo com outra igreja? Se não conheço a historia deles nem a minha, como dialogarei? A primeira frase atravessada que ele jogar vai me deixar confuso, caso eu não saiba explicar a Igreja na qual me batizei e caso nem tenha lido seu catecismo.... Se eu conhecer os erros da igreja, mas, também os seus santos e as suas virtudes; se eu souber enfrentar a história da minha igreja sem mentir a mim mesmo; se admitir que aqui e ali a igreja errou porque seguiu por um caminho que não foi bom naquele tempo, mas um pouco além ela se corrigiu; se perceber que o Espírito Santo não a tinha abandonado, embora muitos de seus membros o tivesse esquecido durante determinado período, terei caminhado de maneira lúcida. Se houve um Papa Libério, um Papa Vigílio e um Alexandre VI e um João XII que não honraram o papado, se houve 39 anti-papas, também houve Gregório Magno, Leão magno, Gregório VII, João XXIII, Paulo VI, João Paulo II, e muitos mártires e santos que dignificam aquela cátedra . O mesmo se diga de outras religiões que tiveram santos e pecadores, entre os quais alguns fundadores. O diálogo fica bem mais sereno quando se admite que os crentes e líderes religiosos não deixam de ser humanos. Será bom admitir que o Espírito Santo leva a Igreja a reencontrar-se naquele movimento, naqueles santos, naquele concílio. Sim, aqui ela errou, mas ali acertou em cheio!... Esta diocese mudou com este bispo, este movimento dominou demais e não deu chance para a catolicidade. Havia outros com muito a dizer, mas não foram ouvidos. O grupo era forte demais e impôs pelo rádio ou pela televisão suas idéias, seus cantos e sua pregação. Não emprestou o microfone a outros grupos. Só dava eles... A Igreja Católica tem um colo muito grande. Ela é toda rahamim. No plural! Raham é colo, entranhas. Deus não tem só um. Ele tem muitos colos. Um deles chamou-se Franciscanos, outro Carmelitas, outro Beneditinos, outro CEBs, outro RCC, o outro Vicentinos, o outro, Apostolado da Oração, o outro os Marianos. Deus tem muitos colos e a gente se aninha num deles para descobrir toda a Igreja que é para nós um colo de mãe.


ABRAÇAR AS OUTRAS DIMENSÕES DA FÉ

Felizmente a Igreja é muito maior do que a dimensão que nós conhecemos, maior que a dimensão dehoniana, na qual eu fui formado. Se eu fosse apenas dehoniano e seguisse só o nosso sociólogo, e advogado padre Dehon seria pouco. Minha própria congregação me colocou em contacto com a espiritualidade dos franciscanos, posto que ele seja um dos nossos patronos. Fui aprender com os redentoristas, com os dominicanos, com os beneditinos. Precisei da riqueza deles para me tornar mais devoniano na Igreja católica.
Fui aprender e aprendo com a RCC. Alguns de vocês me olham de soslaio porque, por eu ter a coragem de dizer o que penso de vocês e às vezes lhes faço críticas, acham que não os admiro nem os amo. Ledo engano. Também lhes faço elogios. A RCC tem uma missão na Igreja de hoje. Ressuscitou valores que andavam esquecidos. E cabe a mim ver o caminhar de vocês para entender as outras renovações, as outras reparações e as outras iluminações que a igreja recebeu e recebe. Somos todos convidados a ser iluminados e iluminadores, abençoados e abençoadores, renovados e renovadores. Mas, primeiro, perdoados e perdoadores. Quando nós aprendermos sobre a verdadeira antropologia cristã e dissermos: Esta irmã tornou-se tal ser humano por causa disso, disso e disso... Este grupo de pessoas tornou-se tal por causa disso, disso e disso quando formos capazes de entender os porquês do outro teremos dado passos gigantes na direção de uma fé mais inteligente e compassiva. Se nosso catolicismo não for isso, acabará sectário. Como quebrar o encanto que nos prende a apenas um grupo na Igreja e nos faz nos sentir estranhos diante outros e até menosprezá-los? Como a gente discerne, distingue e caminha junto? Como discordar sem deixar de admirar e de amar? Aí, a Igreja faz uma pergunta a todos os movimentos familiares e quer saber qual é a contribuição que o MFC, o ECC, o EFC, o ACC, o FCC, as CEBs, a RCC, com a sua espiritualidade típica, vão dar à Igreja para que ela forme mais homens e mais mulheres fiéis ao projeto matrimônio? Como formaremos casais capazes de manter a fidelidade até o fim, mais filhos capazes de respeitar a cultura dos seus pais? ... Como nós formar filhos agradecidos, apaixonados pela família e livres? Os pais não podem escravizar os filhos. Nem os filhos tiranizar os pais. Sejam livres, mas obedientes. Como vamos formar jovens capazes de renovar a sociedade, sem que eles e a sociedade percam os valores fundamentais? Como formar jovens líderes que não regridam na fé e não passem a viver com medo do inferno e do demônio por culpa da pregação pesada do seu mentor excessivamente preocupado com o poder do inimigo e com o fim do mundo?Como formar homens e mulheres capazes de ligar uma televisão e desligá-la se for preciso? Como formaremos pais e mães com autoridade para que o juiz, o delegado, ou outros não tenham interferir e controlar o seu filho? Como viveremos a espiritualidade do nosso movimento que Deus suscitou, formar casais posicionados casais não perplexos, casais que admitem que tenham defeitos, mas estão firmes na sua vocação de matrimônio?


SÓLIDOS COMO ROCHA

Como viver como rocha firme? Casei pra valer! Sei que tenho problemas, sei que minha esposa os tem, sei que meus filhos os têm, mas, mas esse é o meu matrimônio e eu aqui fico porque sou um dos pilares da minha comunidade! Aprendo a perdoar e peço perdão, mas, não desisto do meu projeto de matrimônio! Ajudo minha esposa e meus filhos, com o meu sacrifício e o meu martírio, se for preciso, mas jurei naquele altar viver esse matrimônio e não vou embora. Eu o seguro porque sei o que é ser pessoa e o que poderá suceder aos meus filhos se eu balançar. Agora eu vivo para eles! Essa firmeza, vocês, irmãos da RCC, vão encontrar na sua espiritualidade, que agora pouco chamaram de cultura de pentecostes. Maravilha! Os irmãos de outros movimentos vão buscar a sua profundidade numa outra espiritualidade. Eu a busco na cultura da compaixão e do coração. Mas, eles também vão descobrir que precisam ser rochas e pilares. Como é que isso vai acontecer? Cada grupo, suscitado pelo Espírito Santo, vai achar a sua maneira de motivar uma família a ser sólida. Somente pessoas e famílias sólidas podem criar um mundo solidário.

Aqui eu acentuo a razão de minha palestra de hoje: SÓLIDOS NA DOUTRINA.

Solidário vem de sólido. Não é um que balança a qualquer vento. Sólido é quem, se o outro está caindo, ele o segura porque lhe suporte, posto que é forte e bem enraizado. Por isso: solidário. O vento pode soprar como quiser, vai até mexer com ele, mas ele não cai porque está firmemente plantado. Só um homem sólido, de cabeça sólida, coração sólido e firme, pode ser solidário. Quando for fazer a caridade, vai fazer em nome daquele que o plantou! Pode até sofrer os impactos dos ventos do mundo, mas, não cai. É disso que Jesus falava na sua parábola da casa construída sobre a rocha! (MT 7,24-25) É interessante notar que a comparação vem logo depois de Jesus dizer que não reconhecerá como seus os falsos profetas que usaram seu nome sem respeito e que gritaram Senhor, Senhor, sem ter cacife nem conteúdo para isso. (Mt 7,15-23) Ele quer gente sólida e verdadeira, desapegada e mais forte que a fama, o dinheiro ou o sucesso. Quer catequistas que não se deixem levar por honrarias, aplausos e primeiros lugares. Repreendeu isso o tempo todo nos fariseus que se achavam mais do que os outros. Precisamos tomar enorme cuidado com a teoria do “um passo a mais”. Se entrar numa corrente de espiritualidade representou um passo mais para você, que seja apenas um passo a mais para você e nunca um passo a mais do que o resto da Igreja... Alguns caem nesse terrível engano. Para tristeza minha já ouvi tal pregação de emissora de rádio católica. O pregador literalmente dizia que ser da RCC representava um passo além da fé cristã... Foi assim que começaram Ário, Nestório e Montano! Não poderiam voltar atrás porque tinham dado o passo a mais... Só que o passo a mais pode ser a queda no abismo do orgulho de que acha que não precisa ouvir os outros irmãos!


SE EU ERRAR, CORRIJA-ME!

Se quisermos um mundo justo, fraterno, solidário, capaz de mudar as instituições políticas, capaz de fazer políticas boas, de ir lá representar o seu povo, capaz de, na sua sociedade criar organizações sociais que elevam o homem, precisamos de solidez de vida e de doutrina.O jovem para libertar-se da droga precisa de gente sólida ao seu lado. Sólida no quê? Na espiritualidade, no espírito de oração, no acolhimento, na humildade, na doutrina. Ninguém é sólido, se não se deixa corrigir. Errar, a gente vai. A Igreja tem uma mística belíssima que ultimamente anda um pouco esquecida. É a chamada correção fraterna. Se eu errar, me corrija! Sou seu irmão, não sei tudo! Não acerto sempre! Se você errar, eu, seu irmão, me permito dizer que naquilo você errou. Não estarei dizendo que você é errado, mas que naquilo você errou.

Como são Paulo dizia aos Coríntios 1 Cor 11,17-22:

Nisso eu vos louvo, nisso não vos louvo.
17 Nisto, porém, que vou dizer-vos não vos louvo; porquanto vos ajuntais, não para melhor, senão para pior.
18 Porque antes de tudo ouço que, quando vos ajuntais na igreja, há entre vós dissensões; e em parte o creio.
19 E até importa que haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós.
20 De sorte que, quando vos ajuntais num lugar, não é para comer a ceia do Senhor.
21 Porque, comendo, cada um toma antecipadamente a sua própria ceia; e assim um tem fome e outro se embriaga.
22 Não tendes porventura casas para comer e para beber? Ou desprezais a igreja de Deus, e envergonhais os que nada têm? Que vos direi? Louvar-vos-ei? Nisto não vos louvo.

Se quisermos uma igreja unida, verdadeiramente carismática, verdadeiramente cultivadora dos dons, ela vai ter que pedir perdão e nós com ela. Ninguém de nós é anjo. Nós erramos. Aquele pregador de vida santa pode, de vez em quando, cometer um deslize. A história dos santos famosos o atesta. Foram santos, mas não perfeitos. Só Deus é mil vezes santo e perfeito. Santo erra, às vezes no comportamento, às vezes em palavras e em pregação. Aquele moço tão entusiasmado, maravilhoso, santo (se você for julgar a sua vida pessoal, ele é santo) às vezes comete um erro dizendo ou cantando palavras erradas. Eu tenho que chegar até ele e dizer: - Sou seu irmão, mas, isso aí não bate com a doutrina da nossa Igreja. Se ele ficar zangado comigo é porque não entendeu que o Espírito Santo não o quer cantando contra a Bíblia. Se quando eu for corrigido eu ficar irado, então eu não tenho espiritualidade. Eu tenho mais é que dizer -Muito obrigado, vou me corrigir. Da próxima vez farei certo. Deus lhe pague porque você me corrigiu. Aí, sim, nós estaremos formando uma comunidade perdoada e perdoadora e penitente. Por isso, ela pode ser pregadora. Isto serve para o seminarista que está começando, para o padre novo, para o padre velho como eu (quarenta e dois anos de padre) que posso muito bem ser corrigido por um seminarista que estudou a matéria mais profundamente do que eu. Este seminarista pode me corrigir, sim. Se eu vou atingir milhões com esse erro, ele pode me corrigir. É o meu irmão mais novo a quem Deus deu uma missão. Corrija o velho padre aqui! Mas, eu também, por dever de estado e consciência de homem a quem Deus chamou, apesar dos meus pecados, eu também tenho obrigação de chegar ao outro profeta que é até mais santo do que eu e corrigi-lo, se o que ele disse não bate com a doutrina da Igreja. Aí eu chego a ele, com todo carinho e lhe digo: Eis o que ouvi você pregar. Gravei sua fala. O que você ensinou disse não combina com o que o Catecismo ensina. Da para você corrigir? Se ele aceitar, for com outro e analisar e mudar, eu terei ganhado este irmão para a igreja. Se ele não aceitar, aí ele vai se ver com Espírito Santo. Ou eu terei que me ver com Deus, caso o errado seja eu! Trata-se de uma questão de cortinas. Abre-se, ou fecha-se para a luz. Esse instrumento é salvação numa família: a correção fraterna, materna, paterna e amorosa!
O homem que sabe pedir perdão tem espiritualidade suficiente para ser pai de família. Concordam comigo? Eu já nem disse “que sabe perdoar” porque a gente não sabe perdoar direito. Mas, quem descobriu a graça de pedir perdão, está apto para ser um bom marido, um bom pai de família. Ela, para ser esposa e mãe de família, se souber pedir perdão, conseguiu a coisa mais difícil do mundo que é dobrar-se e dizer: - Errei, desculpa-me! Quem sabe pedir perdão, se um dia alguém errar contra ele, vai perdoar porque sabe o que é estar no lado de lá. São a compaixão e a misericórdia sacudindo suas entranhas. Você foi feito para ter colo e para pedir colo. Aliás, você é o colo de Deus para as pessoas que passam na sua vida, sobretudo, para os mais sofridos e carentes. Então, essa palavra “situados”, num mundo que nos balança e quer tirar o nosso tapete, num mundo que nos sitia, só pode dar certo se formos sólidos na doutrina.


PROFETAS E PROFECIAS

Jesus alertou que sem dúvida nenhuma há profetas no mundo. Sem dúvida nenhuma, há dons. Querer negar que o outro tem um dom, só porque eu não tenho isso, é atentar contra o Espírito Santo. Ele não o deu a mim, mas deu ao outro. Louvado seja Deus! Eu tenho os meus e ele os dele. Se meu irmão diz que tem o dom da cura, quem sou eu para negar? Mas espero que ele prove que o tem e que não seja apenas marketing. O mesmo deve tenho eu quando admito que tenho o dom da interpretação ou do aconselhamento.
Porém é preciso capacidade para discernir se o que digo vem ou não vem do Espírito Santo. O estudo da fé nos capacita para vermos que alguém está nos enganando e enganando o povo. Nisso Jesus mandou ficar esperto. Disse Ele. - Olha, alguns vão dizer: venham comigo que eu sei onde ele está lá no deserto. Venha que eu sei o endereço. Eu sei! Cuidado com essa gente, Jesus disse. Não lhes deis crédito e olha que eu estou avisando de antemão. Muitos farão prodígios e milagres; enganarão a muitos e se possível até os eleitos. Mas, não se deixem enganar. (Leia Mateus 7,14-23 e Mateus 7,15-23. Mateus todo o capítulo 23, e Mateus 24, 13-28. Paulo alerta em 2 Tm 4,1-5 contra os mesmos embustes. Como não me deixar enganar se não deixo a igreja me ensinar? Se nem sequer li o se Catecismo! E aqui há muitos que não o leram... Sei disso! Como é que eu vou ser esperto, prudente como serpente e simples como pomba, se eu ignoro o básico da fé? (Mt 10,16) Eu vou dizer uma frase aqui e queria que, por favor, não a esquecessem, porque ela é para provocá-los: Vocês não têm que ser doutores, mas, se sabem ler, terão que ser leitores. Não há que ser doutor, mas há que ser leitor. Se Deus lhe deu, católico apostólico romano, jovem, adulto, padre, pai de família, a graça de não ser analfabeto e saber ler, então você tem este dever. Tem que conhecer o que sua Igreja fala. Eu quero saber! Estão falando na mídia a favor do aborto, do casamento entre gays, da eutanásia, de anticoncepcional, de contracultura, de bioética, de tolerância, de clonagem? Eu tenho que me perguntar: O que é isso? Católico pode ou não pode? Eu quero saber! Eu tenho filhos! Você talvez diga. Não estou preparado para ler um livro desse calibre! Ninguém falou que você tem que comer dez quilos de comida no mesmo dia. A sugestão é que vá comendo aos poucos. Não engorda e faz bem! Acho que uma das dores da igreja, não só no Brasil, mas, no mundo é que os católicos não são bons leitores. É difícil convencer o povo católico a assinar revista católica. É difícil convencer o povo católico a pegar os principais documentos da Igreja e ler. De livro de espiritualidade gostosa e testemunho de vida, eles gostam. Mas, os documentos da igreja – que é pra eles saberem quando forem pregar ao microfone, como eu aqui – eles não gostam. Até mesmo os líderes padecem desta fraqueza. Alguns odeiam livros! Quando falam, percebe-se logo que não leram os últimos documentos da nossa fé. E são líderes!Alguns são sacerdotes! Infelizmente!...
Aí eu olho para o irmão e digo: - Eu era como você. Mas, ao vinte e dois ou vinte e três anos eu descobri que, se eu queria influenciar a História ao meu redor, eu tinha que saber o que ocorre mundo afora. Aí Deus me deu a graça de estudar fora e ver o que diziam os judeus, os evangélicos, os ateus que ministravam as aulas que eu freqüentava na faculdade. Ouvindo-os eu dizia: - Quero saber o que diz a minha igreja! Eles que falem, porque eu também terei o que dizer! Faço o mesmo ainda hoje. Se vejo, na estante, um livro contra nós prometo procurar um a favor ou resolvo escrever um.Tenho um amigo advogado, muito inteligente. Não é católico demais, mas afirma-se descendente de católico. Ficamos mais amigos depois do que eu lhe disse. Ele também fala coisas que eu não gosto de ouvir. Amigos são para isso! Um dia, ele defendia na rádio em que às vezes atua, o livro de Dan Brown. Disse que aquele livro desmascarava a Igreja através da História. Deixei que ele falasse. Eu estava lá. Quando ele acabou eu disse: -Você é advogado. Quantos livros sobre Direito você já leu? Muitos! Já leu a Bíblia? Seja honesto! Não leu? Já leu algum livro de teologia? Não leu? Inteligente como você é, já leu algum livro de história da Igreja? Não? Mas, Dan Brown você leu! Então você não é mais católico você é danbrownista! Dê uma chance para sua Igreja! Disse ele: - Você me pegou... Prometo que vou ler. Indique-me os livros. Mais que depressa indiquei os livros, principalmente o antropólogos e teólogos que ele deveria ler gente tão inteligente quanto ele e até mais. Indiquei alguns livros de História e disse: - Depois que você ler esse dez livros nós vamos conversar. Sobre isso eu sei mais que você. No estudo da Constituição e de nossas leis será a sua vez de me orientar.


PERPLEXOS DEMAIS

Muitas vezes perdemos de vista o fato de que a perplexidade que toma conta de cabeças católicas nasce do fato de que não se é leitor. Você não faz algo só porque gosta, faz porque tem que fazer. Se um jovem quer se formar, vai ler livros dos quais não gosta, mas, vai ter que ler. O “Ser e o Nada” de Sartre é um livro dificílimo, mas a depender do curso o aluno terá que ler. Então, que tal o católico, no começo ler livros dos quais não gosta, mas, graças aos quais começará a entender é o que a Igreja está dizendo? Se eu não souber o básico da fé não posso ser o padre que quero ser, nem o leigo pregador que pretendo me tornar.
Falo agora, de um pregador que recentemente ensinou um erro colossal no rádio. Quando me encontrar com ele vou lhe dizer o que penso. Não darei o nome aqui. Semana passada, escutei no rádio um rapaz dizendo: - Toda vez que você comete um pecado, você põe mais um espinho na fronte de Jesus e lá no céu ele sangra. Nossa senhora chora perto dele, a cada pecado você comete.
Santo Deus! Isto se falava há duzentos anos. A Igreja não se expressa mais assim. É pieguice pietista. Não é teologia sólida. O conceito de céu e de redenção é outro! O conceito de misericórdia e solidariedade é outro. Jesus não está sangrando no céu. Ele não chora no céu! Nós é que temos que chorar aqui na terra. Porque aquele pregador disse isso? Alguém sem catequese lhe ensinou e ele não progrediu nos estudos... Imagino isso. Se ele é pregador e fala a milhares de ouvidos, não podia ter dito o que disse! Faltou catecismo para aquele moço! Ele pensou que se pode pregar a palavra de Deus, uma hora por noite, ignorando o catecismo da igreja. Não pode! Não pode! Não pode! Seja ele padre ou não, ninguém pode ensinar isso! Se você foi enviado, o bispo o nomeou. O movimento pôs você lá; alguém pediu! O mínimo que você tem a fazer é dizer: - Vou pregar o que sei e estudar mais para pregar melhor!
Sou hoje um militante católico em favor de mais profundidade. Não sou tão profundo como outros colegas padres. Bebo da cultura deles. Mas sou ávido leitor. Há padres maravilhosamente profundos e leigos que dão um banho de cultura religiosa. Conheço rapazes e moças de 27, 28 anos que sabem mais teologia do que alguns padres. Leram. Estudaram! Conheço jovens apaixonados pela igreja, que lutam para ter solidez e querem passar isso lá no seu trabalho. Alguns são jovens médicos e me disseram: - Só a medicina não vai me ajudar a salvar o meu povo; eu quero saber o pensamento da minha igreja, porque lá onde estudo eu me declaro católico e eu sou porta-voz de uma igreja nem sempre aceita! E aqui faço um apelo a vocês irmãos da RCC, que, diga-se de passagem, lêem muito mais do que outros movimentos. Esse elogio vocês merecem. Vocês lêem um pouco mais do que a média dos católicos. (ouve-se palmas) Agora, depois das palmas deixem-me dizer mais uma coisa: Ler, vocês lêem, mas o que é que vocês lêem? Eu sei que a lêem muito Bíblia. Mas, os documentos oficiais da igreja, bem, aí eu sou capaz de apostar que muitos de vocês estão em falta. Conheço-os mais do que imaginam... Sei das suas escolas da fé que são ótimas, mas qual é o percentual dos que as freqüentam? Chega a 5% dos membros da RCC?Isso quer dizer, que, já que desejamos a cultura do aprendizado perguntemo-nos o que disse o Documento de Aparecida. Disse o quê? Que nós temos que ser ao mesmo tempo aprendizes e missionários. Isto quer dizer: a vida inteira aprendendo com toda a igreja. E a vida inteira ensinando o que já sabemos. Mas, para isso eu tenho que ter a cultura do livro certo.


MARTAS E MARIAS DE BETÂNIA

Qual é o livro certo? Qual é o curso certo? É aquele que me põe a par do pensamento da minha igreja, hoje porque eu não posso ser um católico perplexo. Eu me situo. É por este caminho que se vai. Vocês já decidiram. “Quero ser um católico com acento na RCC”. Ótimo! Que seja! A sua mística principal é o louvor. Escolheram o certo porque o primeiro dever de um cristão é o louvor a Deus. Está no nosso Catecismo. Esse é o primeiro dever da criatura humana e dos filhos de Deus. Belíssima escolha! Maria de Betânia, irmã de Marta, escolheu a melhor parte que não lhe foi tirada. Ela quis ficar perto de Jesus e ser evangelizada. Vocês são pouco Maria de Betânia na igreja. Gostamd e louvar e adorar e passam horas orando. Ótimo! Muitos de vocês já conseguiram se tornar Marta também. Porque ela tinha os seus méritos em nada menores do que o da irmã. Ela suou naquela cozinha para servir os hóspedes. Ótimo também. Penso, porém, como irmão que segue carisma semelhante ao de vocês, - o da restauração- talvez pela força apostólica que vocês têm: emissoras de rádio, televisão, livrarias, até editoras, pela força de comunicação que a RCC alcançou – e nisso vocês merecem elogios – vocês podiam ter gente mais profunda e mais preparada nas doutrinas da catequese da igreja. Têm excelentes mestres e pregadores, mas às vezes, falta conhecimento de doutrina a muitos dos seus animadores de rádio e de televisão. É perceptível a falta de leituras mais profundas em alguns dos seus animadores. São simpáticos, fraternos, santos e queridos, mas traem falta de conhecimento da doutrina e dos documentos da Igreja.Eu brinco, mas é verdade. O que se percebe deixa transparecer parecendo que criamos inúmeros hospitais chamados mídia, para curar as dores do povo, mas na hora faltou médico e há porteiros operando e receitando... Há gente despreparada dando aulas e cursos de matéria que não estudaram. A preocupação da igreja é pedir aos jovens que estudem. Sejam especialistas na doutrina católica e não apenas na RCC. Sejam-no também nas doutrinas e nas encíclicas dos papas, nos documentos da igreja do Brasil e mostrem-se especialistas em antropologia porque vocês lidam com o ser humano. Queiram o tempo todo e em conhecer o nosso povo. Isto seria ótimo, porque vocês falam a milhões de ouvidos. Eu sonho ver muitos de vocês nas lideranças de comunidades; vereadores, deputados e tentando como católicos que conhecem a dor do povo ser porta-vozes dele com essa espiritualidade bonita que vivem. Vocês têm o que dar, mas, dão muito pouco, comparado ao poder de comunicação que conseguiram. Não tenho medo de repetir o que disse.
Às vezes, alguns de vocês falam duas horas e não são capazes de citar um documento da Igreja. Olhem que acusação grave que eu estou lhes fazendo. É que eu sou estudioso de comunicação religiosa e gravo os programas. Alguns de vocês com enorme cultura não têm programas de rádio. Porque não? Porque deixam isso a outros que sabem tão pouco? Você escuta o sujeito falando duas horas e ele não consegue citar um documento da igreja, uma encíclica, nem a última mensagem do papa que até repercutiu na mídia. O que ele ou ela fala? Só temas particulares da RCC ou frases bíblicas meio jogadas a esmo. Imaginem se esse moço ou essa moça que tem tão poderoso veículo nas mãos, e fala todo dia a milhões de ouvidos, viesse com os textos catequéticos da sua igreja? Imaginem se eles fossem especialistas em doutrina católica. Como seria bom para o país! E a RCC não perderia nada da sua espiritualidade. Só ganharia! Vocês vieram para renovar, não é?


VIM DESAFIÁ-LOS

Por isso, quando me chamaram para aqui eu disse: - Estou indo falar a uma experiência de igreja fortíssima, espalhada pelo Brasil inteiro. Estou indo mexer com uma das experiências de igreja que mais nos têm dado comunicadores, músicos e instrumentos de comunicação. Estou indo falar a gente que faz acontecer.
Então, direi a eles que está faltando mais solidez de doutrina católica para darmos a esse país um pensamento católico. Só um pensamento carismático não basta. Se eu der só o pensamento dehoniano, eu não estarei dando ao meu país aquilo de que o país e a igreja precisa. Eu tenho que ir além da minha congregação religiosa. Você tem que ir além do seu movimento. Não pode ficar preso nele! Se um franciscano der só um pensamento franciscano, não está dando o suficiente embora seja uma vivência que nos deu centenas de santos. Todos temos que ir além de nossos grupos e comunidades. E vocês também precisam ir além da RCC. Ela é o trampolim, mas, depois, devem buscar profundidade na doutrina profunda e sólida da Igreja para que possam ser verdadeiramente mestres de doutrina católica. Além dos carismas bonitos que vocês vivem vocês poderão ser mestres e catequistas. Não tem que ser doutor. Tem que ser leitor.
Pra encerrar, a família brasileira está assustada, encurralada, perplexa. Os pais não estão sabendo como chegar aos filhos. A televisão todo dia nos provoca. Não é que ela esteja errada em tudo, mas, algumas vezes sim, certamente. Essa provocação não é enfrentada porque nós não temos gente com solidez, nem no Congresso, - embora haja muitos congressistas católicos, - nem em outros lugares. Se tivéssemos essa solidez não teríamos perdido por 6 x 5 na questão da manipulação do embrião. Teríamos influído muito mais porque somos 74% da população. E teríamos, certamente, se fôssemos todos instruídos na doutrina católica, criado uma mentalidade que impedisse essa votação de 6x5. Nós defendemos a vida até as últimas conseqüências. Mas, quando nos passaram esta lei pela garganta ficamos quietos, talvez, porque não sejamos catequistas. Mas, devíamos ser! Esquecemos o exemplo de Eleazar, do livro dos Macabeus que foi catequista de primeira linha. Segundo diz a Bíblia Católica, - este livro não está em Bíblias de outras igrejas por ter sido escrito em grego-, ele era um velho bonito e querido. Foi morto, mas não traiu a catequese e a doutrina que tinha aprendido. Por que? Ele era catequista e era sólido. Ele acreditava no que ele ensinava e deu a vida para não mentir para os mais jovens. Não fingiu come carne proibida para escapar à morte. O rei queria isso. Se dobrasse catequista Eleazar teria dobrado milhares de jovens. Como ele houve muitos que no Brasil e no mundo deram a vida por aquilo em que acreditavam.
Se nós formos capazes disso, poderemos dizer: Tenho minhas falhas, mas sou sólido. Graças a Deus, como Paulo, eu sei em quem acreditei e conheço o que a Igreja diz. Graças a Deus ele me deu um pé firme, um matrimônio firme, caminho firme, porque eu me situei. É este tipo de católico que eu quero ser, com esta espiritualidade que escolhi. Tenho um irmão que é de outra espiritualidade, mas ele também é firme na sua fé. Vamos caminhar juntos. Cada um com seu carisma. Mas, nós juntos teremos mais força. Se não conseguimos ver a luz de Deus um no outro e se tivermos medo de ler o livro do outro, de escutar o outro então nós não seremos fortes.
Parabéns a vocês que me convidaram aqui, sabendo que eu não sou da RCC. Mas saibam que amo vocês e os admiro. Concordo e discordo. Mais concordo do que discordo. Sei que muitos pensam o mesmo de mim. Em muitos aspectos vocês são maravilhosos. É esta igreja que queremos construir, na qual todos que tem algo a dizer, dizem e são ouvidos. Irmãos de outros movimentos que quiserem aprender com vocês terão o que aprender. Vocês conosco! Vocês vivem o que não vivemos e nós vivemos o que vocês não vivem. Carismas são isso.Juntos vamos enriquecer a igreja como um buquê de flores, porque a santidade está espalhada por toda a igreja. Só falta juntá-la e fazer dela a força de uma igreja de mártires, de mestres, de alunos, de aprendizes e de missionários. Se isto acontecer louvado seja Deus. Os primeiros passos estão sendo dados. Juntos, catequistas, com um pensamento sólido. Especialistas em doutrina católica. Seria isso pedir demais? Fiquem com Deus e o Senhor os abençoe sempre!

Pe Zezinho, scj